No próximo Campeonato Mundial de Judô que será realizado entre 20 e 27 de Setembro de 2018, em Baku, a Comissão de Igualdade de Gênero da Federação Internacional de Judô (FIJ), liderada pela Dra. Lisa Allan, organizará a primeira conferência com o tema sobre igualdade entre homem e mulher no Judô.

Conferência de Igualdade de Gênero no Judô - FIJ

Conferência de Igualdade de Gênero no Judô – FIJ

Assim, no dia 19 de setembro, na véspera do Mundial de Judô de Baku, o mundo do judô irá se voltar para discutir o papel e posição da mulher dentro do Judô. Após a abertura do evento pelo presidente da FIJ, Mr. Marius Vizer, os debates terão como base os testemunhos mais que importantes de Mrs. Rozalia-Ibolya Biro (Membra do Parlamento Romeno), Sanda ?orak (Membra da Comissão da FIJ de Igualdade de Gênero e Presidenta da Federação Croata de Judô), Yuko Fuji (Primeira técnica mulher da seleção masculina de Judô do Brasil), Driton Kuka (Kosovo), Akiko Amano (Japão), Majlinda Kelmendi (Kosovo), Sabrina Filzmoser (Austria) e Kate Corkery (Membra da Comissão da FIJ de Igualdade de Gênero e Presidenta da Federação Australiana de Judô). O programa completo do evento pode ser visto no seguinte link: Programa da Primeira Conferência sobre Igualdade de Gênero no Judô.

Abaixo é possível conferir uma reportagem com Yuko Fuji, sobre sua participação na seleção feminina de Judô como técnica e agora como técnica da seleção masculina de Judô do Brasil:

Um pouco de história sobre Igualdade de Gênero no Judô

Desde a sua criação, o Judô já é centro deste debate sobre igualdade de gênero. Infelizmente, com o passar dos anos, o Judô passou a esquecer que a luta por igualdade de gênero estava em sua origem, voltando a ser uma modalidade dominada e dirigida por homens.

A primeira pessoa a lutar pela inclusão e igualdade das mulheres no Judô e na sociedade foi Jigoro Kano. Em sua participação política no governo japonês como educador, Jigoro Kano introduziu em cada prefeitura no Japão colégios para mulheres, coisa que antes não existia. Para Jigoro Kano, a educação deveria ser acessível igualmente a todos, sem discriminação. Como Diretor da Escola Normal e Conselheiro no Ministério da Educação do Japão, Jigoro Kano participou de muitas comissões voltadas a reformar a educação japonesa, e sempre enfatizava a importância da inclusão das mulheres na educação, que para ele, naquela época, eram claramente insuficiente.

Obviamente, Jigoro Kano não desejava que as mulheres apenas fossem igualadas intelectualmente. Ele desejava que elas tivessem o mesmo direito de evolução física e mental que os homens, ou seja, o mesmo acesso ao Judô. Isso motivou Jigoro Kano a fundar o Judô Joshi Kodokan, ou seja, o Judô Feminino Kodokan.

A primeira aluna matriculada na Kodokan foi Sueko Ashiya, amiga de Tomita Sensei, em 1893. Tomita passou a ser o Sensei dela e mais outras cinco mulheres. Em 1904 Jigoro Kano aceitou o pedido de ser o Sensei de Yasuda Noriko, uma mulher que a princípio não gozava de boa saúde. Para Jigoro Kano, ela seria o exemplo de que o Judô poderia ajudar e beneficiar todas as mulhes, não somente intelectualmente, como fisicamente.

A sociedade não aceitava bem a ideia de Jigoro Kano de ensinar as mulheres. Assim, ele teve que reunir muitas autoridades médicas para demonstrar cientificamente que sim, o judô iria beneficiar e propiciar uma melhoria na qualidade de vida das mulheres e em sua inclusão na sociedade.

'Se quer entender realmente o Judô, observe a prática das mulheres'

(Jigoro Kano)
Keiko Fukuda, primeira e única mulher a chegar ao grao de 10º Dan de Judô

Shihan Keiko Fukuda, primeira e única mulher a chegar ao grao de 10º Dan de Judô

Em 1916, graças a grande influência de Jigoro Kano, o judô passou a ser uma das principais atividades de educação física nas escolas femininas por todo o japão. Em 1923, Jigoro Kano deu uma conferência com o título “O judô das mulheres” e três anos depois, deu um curso de duas semanas a doze judokas femininas oriundas de todo o japão para estabelecer as diretrizes especificas do ensino do judô feminino.  Foi neste ano, em 1926, que Jigoro Kano cria oficialmente a seção feminina de Judô na Kodokan, de caráter oficial. Nesta época se inscreveu para ser aluna direta de Jigoro Kano a Keiko Fukuda. Ela foi a aluna mais famosa de Kano. Ela era neta do primeiro Sensei de Kano, Hachinosuke Fukuda, e foi a primeira e única mulher a atingir o grau de 10º dan, grau este somente reconhecido em agosto de 2011, quando ela tinha 98 anos de idade (Keiko Fukuda faleceu em 9 de fevereiro de 2013). O lema da Sensei Fukuda era “Ser gentil, amável e bonita, ainda firme e forte, mentalmente e fisicamente.”

Dada a formalização e padronização do ensino de Judô para as mulheres, se percebeu que era um programa altamente completo e com uma formação ainda mais rigorosa que a formação masculina. Por isso, para simbolizar o reconhecimento especial e a pureza dos objetivos estabelecidos para o Judô Feminino, foi determinado que todas as faixas femininas deveriam ter uma listra branca. Isso reflete muito o que Jigoro Kano dizia sempre em suas conferências: “Se quer entender realmente o Judô, observe a prática das mulheres”.

Infelizmente, muitos dos ensinamentos e do Judô de Jigoro Kano foi esquecido após sua morte, deixando de ser uma ferramenta educativa para ser apenas um esporte. Felizmente, o esporte agora, mais de 100 anos após o início da luta de Jigoro Kano por igualdade de gênero, está resgatando valores fundamentais do Judô. Na época da criação do Judô, a sociedade japonesa era extremamente machista e conservadora. Jigoro Kano usou o máximo de sua força e influência para lutar contra tradições atrasadas e lutar contra o machismo de sua sociedade, através de exemplos que hoje são claramente considerados exemplos de uma luta feminista. Talvez esteja na hora de voltar a observar a prática das mulheres para compreendermos realmente o Judô e como seus valores seguem fundamentais para serem aplicados não somente dentro do dojo mas também fora dele, na luta pela inclusão e igualdade de todos, não importanto o sexo, o gênero, a sexualidade, a cor ou a raça.